segunda-feira, 21 de setembro de 2009

Human (un)kindness


Hoje tive que fazer uma pequena visita ao hospital, as minhas costas estão a dar cabo de mim.

Tive um atendimento hiper-mega-super rápido, nem 15 minutos depois de chegar estava a ser vista pela médica. Infelizmente, apanhei a hora de almoço, e depois de uma pequena injecção no rabiosque lá tive que esperar novamente para a médica falar comigo. Desta vez esperei hora e meia.

Que se faz para passar o tempo, quando não andamos prevenidas com um livro, não nos apetece ler as baboseiras das revistas cor de rosa e já lemos o jornal de fio a pavio?... Observamos os outros.

Assim, comecei a observar (discretamente) os meus companheiros da sala de espera do HSFX. Havia um senhor divertidíssimo, ria até às lágrimas, afinal só tinha uma pulseira verde, não devia ser grave. (Pulseira verde como a minha, mas eu não estava com humor risonho). Uns ouviam música no telemóvel, outros passavam pelas brasas, outros liam jornais deixados pelos que os precederam nos bancos do hospital.

Ao meu lado encontrava-se uma senhora de idade, com os seus 80 anos. Estava acompanhada dos seus extremosos filho e nora. Tendo em conta a proximidade, acabei por reparar mais no comportamento e conversa dos meus vizinhos.

O senhor, com uns 50 e muitos ou 60 anos, com aspecto de funcionário público, era a personificação do filho besta. Tratava a mãe como se fosse uma débil mental, um empecilho para o qual não há muita pachorra. Contrariava tudo o que a esta dizia, ignorava-a quando ela tentava explicar algo, admoestava-a por se ter esquecido dos medicamentos, por não saber onde estava o papel da consulta.

Após poucos minutos disto, comecei a sentir uma genuína antipatia por aquele espécime humano. Diga-se de passagem que, na generalidade, não tenho a raça humana em muito boa conta, e estas atitudes ajudam-me a reforçar esta triste opinião.

Eu tinha uma pulseira verde, o meu problema não era urgente. A senhora de idade tinha uma pulseira verde, o seu problema não era grave. Estávamos sentadas uma ao lado da outra, esperávamos ambas que os senhores doutores acabassem o seu almoço de hospital. Olhei-a nos olhos, com empatia, com carinho. Tenho sempre carinho pelas pessoas de idade.

Encorajada pelo meu olhar, a senhora de idade virou-se para mim e disse: “Também tem pulseira verde... ai, já estou aqui há tanto tempo, sinto-me mal, mas não tenho importância, os médicos estão a almoçar...” Sorri-lhe, ia responder-lhe, mas o amantíssimo filho antecipou-se-me: “Oh Mãe, esteja calada, não aborreça as pessoas. Quando chegar a sua vez logo vai chatear os médicos, deixe estar as pessoas em paz.” A coitada senhora ainda arriscou um: “Estou a falar com esta senhora...” Ao que o magnifico espécime humano rosnou: “Mãe, deixe-se estar quietinha e calada, deixe as pessoas em paz!”. “Está bem filho, eu fico quieta, eu calo-me.” E calou-se, cabisbaixa. Fechou os olhos. Que terá pensado, que terá sentido?

Partiu-se-me o coração. É isto que nos espera quando chegamos a velhos? Ser menosprezados, mandados calar, ignorados, tratados como... lixo humano?

Presumo que aquela senhora tenha educado aquele homem com amor, tenha passado noites sem dormir quando ele adoeceu, lhe tenha dado a mão quando ele começou a andar, tenha beijado as suas feridas quando ele caiu, lhe tenha feito a cama, os almoços e jantares durante anos, o tenha consolado dos seus primeiros desgostos de amor. Presumo que tenha cometido erros pelo caminho, como todos os pais. Mas, pelo que pude ver, o seu maior erro foi não ensinar o filho a ter reconhecimento pelo que ela lhe deu, pelo que ela foi para ele.

Não sei se o senhor tem filhos, espero que sim. Espero que um dia, esteja num hospital, à hora de almoço, se sinta cansado e doente e quando for abrir a boca para falar com um desconhecido que lhe sorri, haja uma voz que lhe diga: “Esteja calado pai, não aborreça as pessoas.”

1 comentário:

  1. Amén a isso! Ingrato do catano!

    Beijocas às três meninas, que já estão devidamente linkadas no meu blog. Sejam muito bem-vindas à comunidade blogueira.

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