quinta-feira, 9 de setembro de 2010

L'enfer c'est les autres... (será?)


Por vezes as pessoas surpreendem-se a si próprias. Foi o que me aconteceu hoje de manhã.

No caminho para o infantário da minha filha, tenho que passar por mais do que uma rua em que só passa um carro de cada vez, ou dois carros bem apertadinhos. Por vezes é muito irritante, porque os carros metem-se pela rua adentro, sabendo que vão ficar presos a meio, o que impede quem vem em sentido contrário de avançar. Ao fim de um ano lectivo é um bocado cansativo ter que aturar este comportamento, mas não posso fazer nada, a não ser cara de chateada.

Vamos então à história banal da minha pequena peripécia do dia. Hoje de manhã, quando estava quase a transpor o último obstáculo, antes de chegar a uma estrada civilizada, aparece-me um miniautocarro de frente. Esqueci-me de mencionar que esta última parte da estrada é em curva, pelo que os que vão a descer (meu caso) não vêm os que vão a subir (caso do autocarro), mas estes últimos têm um espelho que permite ver se vem algum carro a descer.

Ora o senhor do miniautocarro, entra na rua a apitar, quando me faltavam uns cinco metros para chegar ao fim da linha. Fiz-lhe sinal para descer o pouco que lhe faltava, e ele fez-me sinal para subir a rua toda, em marcha atrás, numa curva. Recusei. Dava para passarmos os dois, se nos desviássemos cada um para as bermas da estrada. Ele recusou. E aqui começou a minha batalha interior.

Quem me conhece sabe que não sou uma pessoa de conflitos inúteis. Mas neste momento senti a revolta dos injustiçados, e refugiei-me na estupidez dos casmurros. Tornei-me burra.

Enquanto o senhor do autocarro o desligou e ficou ali à espera, eu fiquei no meio da estrada, a olhar para ele e a que pensar: estás a ser tão estúpida, estás a ser tão estúpida!

Entretanto, sendo a hora que era, começa a formar-se uma fila atrás de mim, e outra atrás do autocarro. Condutores irados vêm ter comigo, a dizer que tenho que recuar. E eu, na minha teimosia, digo que não recuo. Tenho prioridade, estou no fim do caminho e não vou fazer marcha atrás naquela estrada. O condutor olha para mim com ar risonho, boçal e gozão. As pessoas começam a irritar-se, e eu a pensar: estou a ser tão estúpida como os estúpidos que costumo criticar. Mas outro lado dizia: não vergues, a razão está do teu lado.

Um senhor conciliador lá convenceu o condutor a avançar encostado a um lado da estrada, enquanto eu descia rente a uma parede. Cheguei ao fim do caminho envergonhada e a sentir-me derrotada. Perdi a batalha comigo mesma, o meu lado bom foi vencido pela teimosia e mesquinhez do meu lado mau.

Á beira dos quarenta, tenho comportamentos de recreio da primária, quando pensava que estava a tornar-me adulta. Tive a confirmação de uma ideia que tenho há bastante tempo: nunca paramos de nos surpreender, para o bem ou para o mal, e nunca nos conhecemos verdadeiramente. Sou capaz de ser tão estúpida como os estúpidos que me dão cabo da paciência no dia a dia.

Resta-me aprender a lição, inscrever-me no ioga e contar até cem na próxima vez que estiver numa situação em que tenha vontade de puxar os cabelos à Ana Gabriela...

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